quarta-feira, 23 de maio de 2007

O Casarão

quando eu era pequenina, devia ter aí os meus 4 anos, comecei a ver telenovelas brasileiras. Lembro-me que, na altura em que passava "O Casarão", resolvi que queria ser milionária quando fosse grande (isto depois de ter ponderado ser engraxadora de sapatos ou artista de circo - talvez a escolha mais acertada). Milionária de quê? Milhões de bens? Milhões de coisas? Milhões de dinheiro? Não. Milhões de amor. Sim, porque já nessa altura nos era incutida a ideia de que as pessoas "bem sucedidas" eram as mais desejadas e amadas.
Passados 30 anos, reflicto sobre isto incidindo no significado da palavra "sucedido"... alguém nos sucede? sucedemos quem? pode significar submeter-se, vir depois de, tomar o lugar de... não podemos ingnorar que suceder tem laços etimológicos com ceder. Ora, parece-me quase nítido que ser "bem sucedido" implica ceder aos padrões instituídos do que é sucesso (?), vir depois de e fazer igual ou melhor... prestar provas e passar nos testes.
Reconheço agora que, se é um facto que não sou milionária, não tendo concretizado o meu ideal de criança, sou muito menos bem sucedida porque dificilmente cedo para me poder encaixar nos moldes que me foram desenhados. Eu sou a escultora do meu ser, para o bem e para o mal. É difícil que nos amem na nossa forma mais pura, com golpes toscos, disformes, cuja beleza apenas alguns poderão ver, porque o amor é cego. Pode considerar-se mesmo um luxo. Mas vale a pena tentar porque a lucidez e a grandeza de alguém que nos ame assim pode esculpir-nos um pouco para melhor.
Quando a escultura estiver finalmente pronta, há quem diga que esta se dilui e volta com outras formas ao universo que conhecemos. Gosto de acreditar que é assim.

Para a próxima quero ser uma laranjeira, pode ser?

Um comentário:

Rui Guerra disse...

pode, pode.
temos que pedir à TV globo para ir programando a respectiva telenovela.
é bom ser cego.